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quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

O verdadeiro sentido do Festejo de São Gonçalo!

Ao romper das primeiras horas da manhã, o silêncio é quebrado, os 365 dias novamente foram vencidos, chega ao fim a nossa espera, chegou o tão esperado dia 22 de dezembro, dia do levante do mastro!

Pelo ar o som do sino anuncia que a nossa festa já vai começar. Nas ruas pessoas de todos os tipos têm um olhar renovado, uns se perguntam pelas esquinas e calçadas: fulano vem pros festejos desse ano?

No céu fogos rasgam as nuvens e também os nossos corações, a alegria dos fogos anuncia é festa de São Gonçalo!

Fieis aos montes se encaminham para o patamar para o já tradicional café comunitário, iniciativa da inesquecível Dona do Sr. Chico Tabatinga; já no dia anterior se ouvia: amanhã eu vou tomar café com São Gonçalo.

A atmosfera de nossa terra é outra nestes dias dedicados a São Gonçalo, a gente parece ser mais feliz e de fato o somos. Bate em nosso peito a saudade. Os de longe se transportam em pensamentos para junto dos seus. Como escreveu Coelho Neto, romancista brasileiro: “A casa da saudade chama-se memória: é uma cabana pequenina a um canto do coração”. Ouvimos onde e, em que situação estivermos as badaladas do sino da velha matriz, a oração da Ave Maria “puxada” por Dona Anaíde, que debilitada pela idade continua suas rezas, agora em silêncio, o silêncio de Dona Anaíde é a outra metade da Palavra, ou ainda, o lado noturno da Palavra; eu consigo ver o andor  do “Glorioso” enfeitado com toda pompa e  beleza,  por aquela que é considerada a matriarca da Fé e a guardiã primeira da imagem  barroca e bi-centenária de São Gonçalo da Batalha,  a querida Dona Iolete Sampaio.

Tenho por hábito dizer que de onde venho, há um povo, um santo e um passado, um povo acentuado no orgulho de ser batalhense, aí, exatamente aí, está Batalha, que vive no meu pensamento e que é também, de São Gonçalo. É a Terra que me pariu e, que quando Deus quiser, quero sucumbir. É o berço das minhas inquietudes, túmulo dos meus antepassados, ventre que gerou minhas esperanças e me cativou na fé, e abrigo dos verdadeiros amigos

Não é possível falar de Batalha, ou dos batalhenses, sem se passar por suas festas - e, no nosso caso em particular, pela tradicional festa de São Gonçalo.  Mas, não podemos ignorar que além dela existem outros conjuntos de sinais e símbolos a serem lidos e analisados à luz das especificidades que nascem em torno a esta festa, tão antiga quanto a nossa história.

Em suas formas de expressão, nas instituições e ritos que ainda definem seus grandes atores, nas referências aos vultos do passado que ainda povoam o imaginário da festa, as celebrações em louvor ao santo português, que vivera na Idade Média, revelam fortes ecos de um passado festivo sobre o qual é preciso, portanto, nos debruçarmos, se quisermos entender os seus significados. Um mundo feito de continuidades e mudanças, do novo e do velho, que na festa continuamente se recria e se transforma.

Na dinâmica particular das formas de sociabilidade que a festa de São Gonçalo põe em movimento, reside uma trama de símbolos culturais construídos, historicamente, indicando que “o presente seja lá qual for, é reconhecido enquanto passado”.

A celebração festiva do padroeiro, que se repete há mais de um século está viva pelo sentido que imprimiu e continua a imprimir em nós. Sem dúvida, sofrendo os arranjos e interferências que lhe impõem sua situação atual, mas ao mesmo tempo, conservando sua identidade por meio da manutenção desta tradição que serve de referência à cidade e enche de sentido o nosso cotidiano. 
Eu tenho percebido desde que eu era menino, mas só agora tenho condições inteligíveis de analisar que as pessoas demonstravam simbolicamente estarem dando algum sentido às suas vidas quando participavam de novenas, leilões e procissões, etc. e, também nas práticas de sociabilidade permitidas pelos momentos de inversão festiva, ritmado pelo hábito tão nosso de comemorar, aprendido de há muito pelos nossos antepassados.

As cerimônias festivas e religiosas fazem parte da cultura e tradições populares. Reafirmam laços sociais, reúnem e resgatam lembranças e emoções. Expressadas pela dança, canto, culinária, devoções, pois o que vale mesmo é a união, a nostalgia, a festa, o reencontro com os amigos, a celebração da fé, e o compromisso evangélico, que deve nascer de tudo isto.

São nessas manifestações simples que a exuberância do batalhense se mostra por inteira, e é também por isso, que o nosso povo é conhecido pelas festas e animações tão características.

São Gonçalo é um marco na vida e na evangelização desse Povo de Batalha. Nós cantamos em nosso hino: “Ao bom povo de Batalha, vossas bênçãos derramai, como um santo poderoso a Deus por nós rogai!”. Essa é também a razão pela qual São Gonçalo é proclamado por nós como “O Glorioso”.

Os santos emprestam seus nomes aos dias do calendário, às localidades e a nós mesmos. Quantos são os Gonçalos e as Gonçalas em nossa Batalha? Só um censo revelaria! A presença deste santo deixou marcas indeléveis na vida de nossa cidade.

Por onde passa a procissão seja a do mastro no dia 22 de dezembro, ou a do dia 1º de janeiro, os curiosos devotos que se amontoam nas esquinas sofrem de saudades no coração pelos seus que já se foram que chega o “zóio” a marejar, descendo sobre o rosto e lavando a alma do devoto.
Alguns dos parágrafos dessa crônica são repetições da crônica do ano passado, que eu escrevi por esta altura da abertura da festa. Outros são frutos de uma nova reflexão. Porém, não quero me furtar a uma observação.

A festa é um fato antropológico complexo: ela revela um povo e sua cultura. A complexidade da festa comporta também ambivalência e até paradoxalmente. De fato, a mesma poderia ser definida como “conjunto de celebrações comunitárias extraordinárias, em equilíbrio entre espontaneidade e regra, entre alegria e seriedade, entre liberação e descanso, sujeita também a exageros. O objeto da festa pode ser qualquer coisa, desde que seja percebido como um valor. Cada comunidade festeja aquilo que julga importante.

É preciso, porém, que nossa comunidade comece a prestar atenção a determinadas manifestações festivas que constituem um risco sutil e ainda pouco percebido por alguns setores religiosos.

Até certo tempo a programação de uma festa do padroeiro girava em torno da essência da festa: religiosidade e cultura popular. É claro que havia festas, forrós, bailes, mas transcorria tudo dentro de um clima de confraternização de pessoas que também se ocupavam do lado profano, próprio da dimensão social da festa.   

Nos dias atuais, muitos se voltam para programação de shows: qual banda vai “tocar”, em que clube? O "peso de repercussão" da banda, etc.   
Elaboram-se mega programações - de shows - que tiraram o brilho da verdadeira festa do padroeiro.

Convence dizer que eventos qual a festa que Batalha está prestes a vivenciar pode ser chamada Festejos de São Gonçalo? O que acontece nesses eventos: orações, encontro de famílias, ou a destruição de valores, dissimulada em forma de festejo?   

Não podemos tolerar esse uso incorreto e suportado como parte integrante dos festejos de São Gonçalo. O que tem a ver com a beleza de nossas tradições bandas de músicas, que “tocam” e cantam músicas que são verdadeiras apologias à imoralidade, à droga, à prostituição, com conteúdos que incentivam a vida sexual precoce de nossa juventude e adolescência? Julgo que qualquer pessoa de bom censo perceberá que há um direcionamento total para o desvio. E, infelizmente a maioria das pessoas são passivas e coadunam com esta afronta a religiosidade.   

Lembro de um tempo em que os festejos interessavam pela programação religiosa e cultural. Hoje, o incentivo se volta e dá total ênfase aos shows que nada tem a ver com os valores celebrados e vividos pelo santo em questão: São Gonçalo do Amarante, e apagam a religiosidade e a cultura popular, essências da festa de um padroeiro.   

É inegável que houve esta ruptura. Respeito os eventos, mas percebo certo exagero, nas realizações. Que tenhamos grandes e bons eventos, show, etc., mas que não sejam apelativos, não banalize nem se distancie do objetivo principal de uma festa: a ruptura do cotidiano para celebrar a vida e harmonizar as relações coletivas.

Alegremo-nos! Dezembro chegou e, para nós batalhenses, dezembro nos lembra os festejos de São Gonçalo! Aproveitemos para rever os familiares, amigos, renovemos a nossa experiência de fé, recarreguemos a bateria espiritual para mais um ano, em que novamente começará a contagem dos dias à espera da próxima festa! Enquanto ela não chega vivamos cada instante intensamente de nossas novenas, barracas, leilões e procissões.

Boa festa a todos!

Pe. Leonardo de Sales.

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